Jul 25, 2008

notícia no jn by mário crespo


"o homem, jovem, movimentava-se num desespero agitado entre um grupo de mulheres vestidas de negro que ululavam lamentos. "perdi tudo!" "o que é que perdeu?" perguntou-lhe um repórter.

"entraram-me em casa, espatifaram tudo. levaram o plasma, o dvd a aparelhagem..." esta foi uma das esclarecedoras declarações dos auto desalojados da quinta da fonte. a imagem do absurdo em que a assistência social se tornou em portugal fica clara quando é complementada com as informações do presidente da câmara de loures: uma elevadíssima percentagem da população do bairro recebe rendimento de inserção social e paga "quatro ou cinco euros de renda mensal" pelas habitações camarárias. dias depois, noutra reportagem outro jovem adulto mostrava a sua casa vandalizada, apontando a sala de onde tinham levado a tv e os dvd. a seguir, transtornadíssimo, ia ao que tinha sido o quarto dos filhos dizendo que "até a tv e a playstation das crianças" lhe tinham roubado. neste país, tão cheio de dificuldades para quem tem rendimentos declarados, dinheiro público não pode continuar a ser desviado para sustentar predadores profissionais dos fundos constituídos em boa fé para atender a situações excepcionais de carência. a culpa não é só de quem usufrui desses dinheiros. a principal responsabilidade destes desvios cai sobre os oportunismos políticos que à custa destas bizarras benesses, compraram votos de norte a sul. é inexplicável num país de economias domésticas esfrangalhadas por uma euribor com freio nos dentes que há famílias que pagam "quatro ou cinco Euros de renda" à câmara de loures e no fim do mês recebem o rendimento social de inserção que, se habilmente requerido por um grupo familiar de cinco ou seis pessoas, atinge quantias muito acima do ordenado mínimo. é inaceitável que estes beneficiários de tudo e mais alguma coisa ainda querem que os seus T2 e T3 a "quatro ou cinco euros mensais" lhes sejam dados em zonas "onde não haja pretos". não é o sistema em portugal que marginaliza comunidades. o sistema é que se tem vindo a alhear da realidade e da decência e agora é confrontado por elas em plena rua com manifestações de índole intoleravelmente racista e saraivadas de balas de grande calibre disparadas com impunidade. o país inteiro viu uma dezena de homens armados a fazer fogo na via pública. não foram detidos embora sejam facilmente identificáveis. pelo contrário. do silêncio cúmplice do grupo de marginais sai eloquente uma mensagem de ameaça de contorno criminoso - "ou nos dão uma zona etnicamente limpa ou matamos." a resposta do estado veio numa patética distribuição de flores a cabecilhas de gangs de traficantes e auto denominados representantes comunitários, entre os sorrisos da resignação embaraçada dos responsáveis autárquicos e do governo civil. cá fora, no terreno, o único elemento que ainda nos separa da barbárie e da anarquia mantém na quinta da fonte uma guarda de 24 horas por dia com metralhadoras e coletes à prova de bala. provavelmente, enquanto arriscam a vida neste parque temático de incongruências socio-políticas, os defensores do que nos resta de ordem pensam que ganham menos que um desses agregados familiares de profissionais da extorsão e que o ordenado da psp deste mês de julho se vai ressentir outra vez da subida da euribor.
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